Revista geo-paisagem (on line)

Ano  8, nº 15, 2009

Janeiro/Junho  de 2009

ISSN Nº 1677-650 X

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 Revista classificada pela CAPES

 

 

 

Parque Estadual do Três Picos/RJ: aspectos ambientais e conflitos territoriais *

Luiz Renato Vallejo[1], Rodrigo de Melo Campos[2] e Wilson Messias dos Santos Júnior [3]

 RESUMO 

O presente artigo apresenta as principais características ambientais do Parque Estadual dos Três Picos (PETP), estado do Rio de Janeiro, além de fazer uma síntese dos conflitos territoriais pesquisados durante os trabalhos de campo realizados entre os anos de 2007 e 2008. O PETP, criado em 2002, é a maior unidade de conservação estadual com 46.350 ha. Sua vegetação é caracterizada por diferentes formações, cada qual com suas respectivas tipologias florestais, condicionadas a partir do relevo formado por fortes aclives. O entorno apresenta atividades agropastoris (em maior escala), turísticas e pequenas ocupações urbanas. Os maiores conflitos observados decorrem do corte da vegetação e uso de fogo, além da apreensão de animais silvestres. Diversas propriedades particulares estão localizadas no interior do parque, já que o poder público ainda não promoveu a regularização fundiária.  

Palavras-chaves: parque estadual, conservação, conflitos territoriais

ABSTRACT 

This article intends to show the environmental features and territorial conflicts of the Parque Estadual dos Três Picos (PETP), Rio de Janeiro State. The studies occurred between the years 2007 and 2008 . The PETP, created in 2002, is the largest unit of 46,350 ha of the Rio de Janeiro state. Its vegetation is characterized by different forest compositions constrained by features of topography, in general, very rugged. The main uses of land in the vicinity of the park are: agriculture, pasture, tourism and small urban occupations. The territorial conflicts observed were: deforestation, fire, and seizure of wild animals. Several private properties are located within the park, since the government has not promoted the settlement land.

 Key-words: natural parks, conservation, territorial conflicts.

 

Introdução

Criado pelo Decreto Estadual nº. 31.343, de 06/06/2002, o Parque Estadual dos Três Picos (PETP) é a maior unidade de conservação de proteção integral do Estado do Rio de Janeiro, com 46.350 hectares de área. Tem como principal objetivo conservar uma grande extensão contínua de florestas em excelente estado de conservação ocupando a Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro, mais particularmente, a Serra dos Órgãos. Com a criação do PETP, o estado do Rio de Janeiro teve um acréscimo de 75% na área protegida. Cerca de metade da área do parque encontra-se no município de Cachoeiras de Macacu (49,1 %) e o restante divide-se entre os municípios de Teresópolis (19,9 %), Nova Friburgo (19,7 %), Silva Jardim (7,1 %) Guapimirim (4,0 %). O parque também integra o Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense, que conta com 22 UC’s distribuído em 13 municípios e possui área total de 233.710 ha (Campos, 2007).

A proposta de criação do PETP foi baseada em detalhado estudo de pré-viabilidade, que incluiu o reconhecimento fundiário, o levantamento e caracterização da cobertura vegetal e do uso do solo e o potencial turístico e econômico da região. O estudo foi financiado pelo Banco de Desenvolvimento da Alemanha (KfW - Kreditanstalt für Wiederaufbau) no ano de 2000, apoiando o Projeto de Proteção à Mata Atlântica (PPMA-RJ).

As principais vias de acesso ao PETP são: 

RJ-116 – administrada pela empresa Concessionária Rota-116 S/A, tem início no município de Itaboraí, passando por Nova Friburgo e terminando no município de Macuco, na Região Serrana. Através desta via pode-se acessar a atual sede do parque, na localidade de Boca do Mato, em Cachoeiras de Macacu. Entre Cachoeiras de Macacu até a divisa do município de Nova Friburgo, a RJ-116 atravessa uma grande extensão do parque.

RJ-130 - conhecida como Teresópolis - Nova Friburgo, acompanha de perto todo o perímetro ao norte do PETP. Além da grande importância para o turismo local, contribui para agilizar o escoamento da intensa produção agrícola, característica de várias localidades dos municípios de Nova Friburgo e Teresópolis. Através dela, também é possível acessar a estrada municipal que leva ao principal conjunto montanhoso do PETP, onde se localizam os Três Picos, feições de relevo que inspiraram o nome do parque. O acesso à sub-sede de Salinas também é realizado através desta estrada.

RJ-122 - interligando os municípios de Guapimirim e Cachoeiras de Macacu, acompanha quase todo o perímetro sul do parque. Por ela, tem-se acesso à outra sub-sede de Guapimirim, na localidade do Paraíso, onde também está localizada a Estação Ecológica Estadual do Paraíso e o Centro de Primatologia do Rio de Janeiro.

BR-116 – também conhecida como Rio-Bahia, sobe a serra de Guapimirim até Teresópolis e, nesse trecho, praticamente serve como divisor entre o PETP e o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, de onde se avista a famosa formação rochosa Pico Dedo de Deus.

BR-101 – interligando a Região Metropolitana do Rio de Janeiro ao norte do estado, pode-se ter acesso às localidades de Gaviões e Correntezas (ambas em Silva Jardim), acessíveis pelas RJ-126 e RJ-140, respectivamente. Desta forma pode-se ter uma aproximação dos limites sul e sudeste do parque.

Além destas, existem inúmeros acessos através de estradas secundárias, geralmente em mau estado de conservação ou sem asfaltamento.

 

Síntese ambiental

Geologia e relevo

Geologicamente a região onde está situado o PETP (Serrana do Estado do Rio de Janeiro), é constituída por rochas graníticas e gnáissicas pertencentes ao Terreno Oriental da Faixa Ribeira (HEILBRON et al., 2000 apud FBCN, 2007).

Existem quatro grandes domínios geomorfológicos que podem ser observados no segmento central da Serra do Mar do Estado do Rio de Janeiro e arredores, onde se localiza o parque: a) escarpa sul (atlântica); b) o planalto e a vertente norte da Serra dos Órgãos; c) planalto da Serra de Macaé de Cima; d) baixadas colinosas (Campos, 2007).

A escarpa sul apresenta vertentes íngremes com grandes desníveis altimétricos e vales fluviais profundamente encaixados. As encostas quando não são constituídas por paredões rochosos, são freqüentemente cobertas por depósitos sedimentares ricos em matacões e blocos de rochas, em geral, oriundos de movimentos de massa (deslizamentos). A vertente sul é drenada pelas cabeceiras de diversos rios que migram para a Baía de Guanabara, onde se destacam os contribuintes das bacias dos rios Macacu e Guapiaçú.

A vertente norte e o planalto da Serra dos Órgãos formam uma região montanhosa com desnivelamentos topográficos menores que a escarpa sul. Esta unidade é caracterizada por alinhamentos serranos de direção E-NE com escarpas internas e vales suspensos, sendo drenada por rios tributários do vale rio Paraíba do Sul.

O limite do planalto com a escarpa sul corresponde ao divisor de águas da Serra do Mar, cujas altitudes variam de 1400 a mais de 2000 m, onde se destacam como as principais elevações: a Pedra do Sino (2.263 m) e do Açu, entre Petrópolis e Teresópolis (fora do PETP), o Pico da Caledônia (2.219 m) entre Nova Friburgo e Cachoeiras de Macacu, assim como os picos Maior (2.316 m), Médio, Menor e Capacete, estes inseridos na porção central do PETP, entre Nova Friburgo e Teresópolis.

O planalto da Serra de Macaé possui um relevo com altitudes e desnivelamentos topográficos menores que o planalto da Serra dos Órgãos, estando situado a leste e sendo caracterizado por vales suspensos das cabeceiras do rio Macaé. Este rio possui trechos encachoeirados e drena para leste em direção a localidade de Lumiar até atingir a região de baixada de Casimiro de Abreu, rumo ao litoral de Macaé, na Região Norte Fluminense.

Por fim, ocorre o domínio das baixadas situadas em cotas mais baixas no sopé da escarpa sul, caracterizado por um relevo colinoso de baixa amplitude topográfica. Este domínio é ainda marcado por fundos de vales largos e aplainados preenchidos por depósitos sedimentares fluviais (planícies de inundação e terraços), onde os canais são geralmente meandrantes. Esta região de colinas é drenada pelas bacias do médio e baixo curso dos rios Macacu e Guapiaçu, que seguem para o recôncavo da Baía da Guanabara, além do rio São João, que drena a Região dos Lagos, a leste (FBCN, 2007).

Clima e solos

O clima na área do PETP varia do tropical Af (na escala de Koppen) nas partes mais baixas (Cachoeiras de Macacu e Silva Jardim) ao mesotérmico brando Cfb nas áreas acima de 1.200m, com verões brandos (média simples do mês de fevereiro entre 15° C e 18° C) e invernos frios (média simples do mês de julho abaixo de 10°C). No PETP são registradas as maiores incidências de geadas no estado do Rio de Janeiro, perdendo apenas para o PN do Itatiaia. Freqüentemente são verificadas temperaturas negativas nos picos e, com menor frequência, nos vales ao redor.

As médias pluviométricas anuais superam 2.000 mm nas áreas de barlavento (vertente sul), ficando pouco abaixo deste valor nas áreas de sotavento (vertente norte). Nos meses de verão as chuvas têm causas orográficas e estão associadas a instabilidades causadas por frentes frias e movimentação da convergência intertropical. Os valores médios mensais podem ultrapassar os 300 mm. Ocorrem, eventualmente, precipitações intensas de até 150 mm em um período de 24 horas. Nos meses de inverno os valores são bem mais modestos. Neste período, a seqüência de dias sem chuva pode chegar a 20.

Na área do PETP são encontrados os seguintes tipos de solo:

1.      Latossolo – na área do parque, ocorre somente a variação Latossolo Vermelho-Amarelo, encontrada nas áreas mais baixas e externas, estando associados especialmente à Floresta Submontana e um pouco da Floresta Montana. No entorno do PETP pode-se observar uma predominância do Latossolo Vermelho (LV).

2.      Cambissolo – é predominante na área do PETP, sendo essencialmente mineral, pouco evoluído e de características bastante variáveis, mas em geral pouco profundos ou rasos. Ocorrem nas áreas intermediárias do PETP, associados especialmente às Florestas Submontana e Montana.

3.      Neossolo – também chamado de solo litólico. Ocorrem nas partes mais altas e íngremes do PETP, associados à Floresta Altomontana e aos Campos de Altitude.

4.      Afloramentos rochosos.

 

Vegetação e fauna

Em suas densas matas foram detectados os mais elevados índices de biodiversidade em todo o Estado sendo, por isso, considerada uma região da mais elevada prioridade, em termos de conservação, pelos especialistas.

A região compreendida pelo PETP e demais unidades de conservação adjacentes forma um corredor ecológico na parte central do Estado. Ela é caracterizada por possuir diferentes formações vegetais condicionadas a partir do relevo formado por fortes aclives. Esse contexto da Mata Atlântica, formada por serras, grotas e picos, diversifica-se predominantemente em três formações básicas da Floresta Ombrófila Densa: Submontana, Montana e Altomontana; e por Campos de Altitude.

Na área do parque, a maior parte é ocupada pela Floresta Ombrófila Densa Montana. De maneira geral, as fisionomias encontradas estão em bom estado de conservação, com algumas exceções. No parque também ocorrem áreas onde houve intervenção humana, seja para fins de mineração, agrícola ou pecuária, descaracterizando a vegetação primária. Após o abandono, essas áreas reagiram diferentemente de acordo com o tempo e o uso que tiveram, porém a vegetação que surge reflete de maneira bastante uniforme os parâmetros ecológicos da sucessão vegetal, complementada pela evolução da fauna. Onde ocorre maior pressão desse tipo é na borda da vertente norte da serra, nos municípios de Teresópolis e Nova Friburgo (FBCN, 2007).

Entre as espécies relevantes da flora encontramos: jequitibá-rosa (Cariniana legalis), jequitibá-branco (Cariniana estrellensis), pinheiro-do-paraná (Araucaria angustifolia), imbiú (Guatteria dusenii), peroba (Aspidosperma discolor), palmito jussara (Euterpe edulis), ipê-amarelo (Tabebuia alba), ipê-roxo (Tabebuia heptalhylla), maçaranduba (Manilkara elata), sapucaia (Lecythis lanceolata), jatobá (Hymenaea courbaril), ingá (Inga barbata), jacarandá (Dalbergia foliolosa), quaresmeira (Tibouchina granulosa), cedro-vermelho (Cedrela odorata) (FBCN, 2007).

Em relação à fauna, existem muitas espécies ameaçadas, especialmente de grandes mamíferos como o porco do mato, a lontra e a jaguatirica ou aves como o gavião-pega-macaco, que lá encontram refúgio. O PETP forma um grande corredor florestal contínuo com o PN da Serra dos Órgãos e com a EE do Paraíso, em Guapimirim.      

Entre as espécies relevantes da fauna de mamíferos, encontramos: suçuarana ou onça-parda (Puma concolor), maracajá (Leopardus wiedii), caxinguelê (Guerlinguetus ingrami), cutia (Dasyprocta agouti), ouriço-caixeiro (Sphiggurus insidiosus), tatu-galinha (Dasypus novemcinctus), cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), paca (Cuniculus paca), capivara (Hydrochaeris hydrochaeris), lontra (Lutra longicaudis), tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla), mico-leão-dourado (Leontopithecus rosalia), preguiça-de-coleira (Bradypus torquatus), macaco–prego (C. nigritus), muriqui ou mono-carvoeiro (Brachyteles arachnoides) (FBCN, 2007).

Espécies relevantes de aves: gavião-pega-macaco (Spizaetus tyrannus), gavião-pombo-pequeno (Leucopternis lacernulatus), gavião-pombo-grande (Leucopternis polionotus), gavião-desobre-branco (Percnohierax leucorrhous), macuco (Tinamus solitarius), uru (Odontophorus capueira), cuiú-cuiú (Pionopsitta pileata), coruja-preta (Strix huhula), beijaflor-rajado (Ramphodon naevius), entufado (Merulaxis ater), papa-moscas-de-olheiras (Phylloscartes oustaleti), tesourinha-da-mata (Phibalura flavirostris), araponga (Procnias nudicollis), iraúna-grande (Molothrus oryzivorus) (FBCN, 2007).

Espécies relevantes de répteis: jibóia (Boa constrictor), jararaca (Bothrops jararaca), cobra-coral (Micrunus coralinus), lagarto-verde (Ameiva ameiva), (Eleutherodactylus binotatus), sapo-cururu-grande (Bufo icterius), cágado-da-serra (Hydromedusa maximiliani) (FBCN, 2007).

Os levantamentos da fauna de artrópodes indicaram alta diversidade de aracnídeos, com 60 espécies em 53 gêneros. Entre os insetos, os coleópteros foram os mais abundantes, com 13 espécies em 8 famílias; os lepidópteros, com 7 espécies em 4 famílias de mariposas. Também foram encontrados exemplares das ordens Hemíptera, Homóptera, Mantodea e Hymenoptera (FBCN, 2007).

 

O parque e sua infraestrutura administrativa

Depois da sua criação em 2002, o PETP recebeu investimentos de medidas compensatórias previstas na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC (Artigo 36 da Lei 9.985 de 18/06/2000). A empresa TermoRio S/A, ficou responsável por investir R$ 13.895.000 no total, sendo que R$ 6.058.000 foram destinados exclusivamente para o “Projeto de Consolidação do PETP”. Com parte desses recursos foram feitos importantes avanços na consolidação do parque, como: a elaboração parcial do Plano Diretor e de Manejo; a aquisição da propriedade e da casa onde funciona a atual sede; a construção do centro de visitantes e a contratação de guardiões para os serviços rotineiros. Posteriormente, foram destinados mais R$ 790 mil oriundos de outra medida compensatória para a construção de guaritas, pórticos e melhorias de acesso e na fiscalização.

O PETP conta atualmente com quatro núcleos operacionais: Núcleo Cachoeiras de Macacu, Núcleo Salinas/Nova Friburgo e Núcleo Jacarandá/Teresópolis. Além desses três núcleos, o PETP possui uma sala de apoio dentro da Estação Ecológica Estadual do Paraíso (EEEP) no município de Guapimirim, sendo considerada um 4º núcleo. O município de Silva Jardim, localizado na Região das Baixadas Litorâneas, não conta ainda com nenhum núcleo.

Na sede do PETP, localidade de Boca do Mato (Cachoeiras de Macacu), encontramos a maior parte das benfeitorias e do patrimônio do parque, resultantes dos investimentos da  TermoRio S/A. Uma casa de dois pavimentos com salão, cozinha, alojamento para os funcionários e pesquisadores; dois escritórios com computador, aparelho de fax, estantes e mesas de escritório e para reuniões. Existe um Núcleo e Prevenção de Incêndios (NuPIF) com computador e almoxarifado com equipamentos e materiais para combate à incêndio.

Existem 4 pick-ups neste núcleo, disponíveis para o transporte de equipamento e pessoal em atividades administrativas, de fiscalização aos crimes ambientais, combate e prevenção aos incêndios florestais, cadastro de moradores e educação ambiental. Também existem equipamentos de radiotransmissão fixos e portáteis, aparelhos de GPS, ferramentas para manutenção das trilhas, trenas, clinômetros, entre outros. No núcleo trabalham cerca de quinze funcionários, entre fixos e terceirizados (dados de março de 2008).

Junto à sede administrativa existe um Centro de Visitantes, com amplas dependências para a realização de eventos e atividades, tais como: palestras, exposições, apresentação de vídeos e recepção de visitantes. Também pode servir à montagem de laboratórios. Entretanto, até a presente data, o Centro de Visitantes ainda não tinha sido aparelhado com mobiliário e equipamentos para cumprimento de seus objetivos.

Bem perto da sede do parque, existem duas trilhas estruturadas para recepção de visitantes: a do Mirante com mesas e cadeiras no final de seu percurso e onde se pode apreciar a paisagem do vale cortado pela RJ-116 e a Trilha do Jequitibá, principal atração desse núcleo. Contando com uma boa sinalização e elementos de apoio educacional, termina em local onde pode ser visualizado um exemplar da espécie Cariniana Legalis, mais popularmente conhecida como jequitibá-rosa. A árvore tem cerca de 35 m de altura e 12 m de diâmetro a cerca de 1,5 m de sua base.

Na sub-sede do Núcleo Salinas (Nova Friburgo), as condições são bem diferenciadas. Trata-se de uma casa antiga, alugada, com instalações precárias, sem eletricidade e encanamento de água. Ela fica localizada fora dos limites do parque onde existem algumas placas indicativas. Este núcleo conta com um quadriciclo 4x4 e uma motocicleta, sendo utilizados como alternativa aos veículos tradicionais em acessos mais difíceis. Entretanto, ambos estavam inoperantes na época da visitação por falta de manutenção. Os responsáveis pelo lugar dispõem de um radiotransmissor fixo e outros portáteis para comunicação intra e inter-núcleos. Em março de 2008, trabalhavam cinco funcionários em regime de revezamento, todos terceirizados. Através desta sub-sede tem-se acesso ao conjunto dos Três Picos e demais formações rochosas da região.

O Núcleo Jacarandá (Teresópolis), conta com uma guarita de fiscalização além de algumas placas indicativas, um quadriciclo e radiotransmissores portáteis. Há também uma trilha bem conservada próxima a guarita, com corrimãos, degraus, mesas e cadeiras para descanso ao longo do caminho. Trabalham 5 funcionários terceirizados, além de um fiscal do quadro fixo do PETP, que utiliza uma pick-up equipada com radiotransmissor móvel. Há ainda um automóvel que é utilizado em tarefas, principalmente no próprio município. O local, entretanto, sofre com problemas de ocupação e vandalismo, pondo em risco a integridade das estruturas ali existentes.

Em Guapimirim, a administração do parque dispõe de uma sala própria localizada dentro das instalações da Estação Ecológica Estadual do Paraíso (EEEP), contando com um funcionário terceirizado, radiotransmissores e um computador. Este núcleo tem o apoio logístico do Centro de Primatologia do Estado do Rio de Janeiro (CPRJ), administrado pela FEEMA (atual INEA) e localizado dentro da EEEP.

O PETP já tem o seu Conselho Consultivo estruturado (Portaria IEF nº 177 de 14/02/2006), sendo presidido pelo próprio administrador do parque e contando com a participação de representantes do poder público, iniciativa privada e sociedade civil, assim distribuídos:

Setor governamental - IEF, IBAMA, FEEMA, CBMERJ, Prefeituras de Cachoeiras de Macacu, Silva Jardim, Nova Friburgo, Teresópolis e Guapimirim

Setor não governamental - UERJ, Universidade Fundação Educacional Serra dos Órgãos (UNIFESO), Reserva Ecológica Guapiaçú (REGUA), TEREVIVA, Associação Mico Leão-Dourado (AMLD), Federação das Associações de Moradores de Teresópolis, Associação De Moradores de Macaé de Cima, Concessionária Rota 116 S/A, Federação de Esportes de Montanha do Estado do Rio de Janeiro (FEMERJ).

            Em 2008, o IEF (atual INEA) empreendeu esforços no sentido de ampliar e fortalecer a participação de todos os Conselhos Consultivos dos parques estaduais sob sua responsabilidade e, por conta disso, estão ocorrendo mudanças na composição do atual conselho do PETP.

A grande questão que se coloca em relação ao PETP, e que se aplica a todos os parques que receberam investimentos das medidas de compensação ambiental, é que os recursos estão acabando e não há garantia de continuidade para manutenção de pessoal e das estruturas montadas inicialmente. As verbas orçamentárias do governo estadual são escassas e não irão suprir os custos atuais de manutenção. Isso já está se refletindo no sucateamento de algumas necessidades como veículos, verbas para combustíveis, manutenção predial, etc.

 

Os estudo dos usos e conflitos territoriais

Para desenvolvimento deste tópico do trabalho, foram consideradas as observações diretas dos trabalhos de campo e dos mapeamentos realizados com ajuda das imagens de satélite. A seguir serão apresentadas as descrições dos usos e eventuais conflitos territoriais legais observados nas diversas localidades visitadas no entorno e interior do PETP.

Boca do Mato (Cachoeiras de Macacu)

Nas proximidades imediatas da Sede do PETP, foram observadas diversas propriedades (19) decorrentes de ocupações anteriores à criação do parque. A maioria delas é ocupada temporariamente por seus proprietários, permanecendo, em alguns casos, somente os caseiros e seus familiares. São residências utilizadas como 2ª moradia nos fins de semana e feriados. A proximidade da sede do parque facilita o estabelecimento de um certo nível de controle sobre as atividades residenciais, que podem ser classificadas como de baixo impacto ambiental (pequena produção de lixo e esgoto, animais domésticos, etc). A maior preocupação com este tipo de ocupação reside na eventualidade de incêndios provocados pela queima inadequada de lixo.

Trecho da estrada RJ –116 (Cachoeiras de Macacu)

A estrada RJ-116 atravessa o parque constituindo-se num dos elementos de maior potencialidade para produção de impactos ambientais no parque. Entre eles, destacamos:

Ø  grande fluxo de automóveis, ônibus e caminhões e os eventuais acidentes com transporte de cargas perigosas e combustíveis, produção de ruído, emissão de poluentes atmosféricos, poluição de recursos hídricos, atropelamentos de animais e incêndios;

Ø  propagandas através do uso de “out doors”, colocados em locais inadequados do ponto de vista da segurança de tráfego;

Ø  pontos de parada para venda de produtos que se constituem em focos de acumulação de lixo, sem a devida sinalização e infra-estrutura;

Ø  pontos destinados às atividades religiosas, eventualmente geradoras de impactos em função dos detritos, velas acesas e a possibilidade de degradação da paisagem natural;

Ø  viabilidade de acesso e estímulo às ocupações marginais na estrada, sendo que a maioria delas já existia antes da criação do PETP

As ocupações existentes no interior do parque representam riscos potenciais para a preservação do ecossistema florestal e demais sistemas associados. As ocupações, mesmo que temporárias, podem ser acompanhadas de problemas com resíduos sólidos (lixo), esgotos domésticos, fogo, corte de vegetação, atração e captura de animais silvestres, transmissão de zoonoses, além de outros impactos previsíveis. A maioria das residências e sítios, já existia antes da implantação do parque, portanto, caso não ocorram iniciativas de desapropriação, faz-se necessário implementar ações preventivas rotineiras.

            Cachoeiras de Macacu (área urbana )

A área mais urbanizada da cidade de Cachoeiras de Macacu está localizada próximo PETP, sendo que os limites do parque passam por cotas altimétricas em pontos mais altos e íngremes do relevo. As ocupações urbanas, principalmente as de baixa renda avançam morro acima, mas não chegam a alcançar os limites do PETP. Na saída da cidade, em direção à Guapimirim, existem condomínios e, nas margens da estrada, foram observadas atividades comerciais, além de sítios onde ocorre a exploração de culturas agrícolas, tais como banana, mandioca, coco, etc. Em localidades ao longo da RJ-116, na subida de serra em direção à Nova Friburgo, o perfil de uso é turístico além das atividades agrícolas. Existem muitas propriedades dentro dos limites do parque.

 

            Guapiaçú (Cachoeiras de Macacu)

            Percorrendo uma estrada vicinal que dá acesso à localidade de Guapiaçú, logo após a confluência das rodovias RJ-116 e RJ-122, observamos várias áreas no entorno do parque com usos pecuário e agrícola. Existem plantios de mandioca, taioba e inhame, principalmente nas margens do Rio Guapiaçú. No final da estrada de Santo Amaro, uma empresa promove a extração de água mineral das marcas Cascataí e Superlev. Por conta disto, existe grande movimentação de caminhões ao longo da estrada. Também existe uso turístico, em pequena escala, tendo como suporte principal a presença de um hotel fazenda que promove diversas atividades como caminhadas em trilhas na área - Hotel Fazenda Santo Amaro.

 

            Faraó e Faraó de Cima (Cachoeiras de Macacu)

            Trata-se de uma zona rural no entorno do PETP localizada mais ao sul do centro urbano de C. de Macacu. Apresenta uso agrícola (banana, milho, mandioca, etc) além da presença de sítios, haras e residências permanentes. Existe captação de Água Mineral na localidade de Faraó (marca Maratuã). Existem plantações de banana que avançam encosta acima e trilhas que dão acesso ao parque na direção da Pedra do Faraó. O entorno do PETP é caracterizado por usos agrícola e pecuário.

 

            Paraíso (Guapimirim)

            A localidade de Paraíso está inserida em área protegida pela Estação Ecológica de Paraíso sob controle estadual (INEA/RJ). Existe o Centro de Primatologia do RJ (CPRJ) e a área de captação e tratamento de água da CEDAE. Os limites do parque estão localizados acima em zonas mais íngremes e altas. A vegetação florestal encontra-se em bom estado de conservação. No entorno existem áreas de pastagem e agricultura, além de trechos em processo de regeneração florestal. Segundo depoimento de um guardião que trabalha na EE do Paraíso, é comum ocorrerem problemas com caçadores na área.

            Caneca Fina (Guapimirim)

          Situada nas proximidades dos limites do parque, a localidade de Caneca Fina apresenta uso predominantemente residencial na forma de condomínios (2ª moradia), moradias isoladas e sítios. Grande parte da área de um destes condomínios está dentro dos limites do parque

 

            Meudon e QuintaLebrão (Teresópolis)

            As duas localidades se caracterizam pela alta densidade de ocupação, principalmente por famílias de renda mais baixa. Pode-se afirmar que estas áreas apresentam os maiores índices de densidade populacional nas imediações do parque. Algumas residências mais antigas estão localizadas dentro do parque em ambas localidades. Outras ocupações vêm ocorrendo mais recentemente, invadindo áreas do parque. O espaço onde se encontra o Núcleo Jacarandá representa uma opção de lazer para os moradores locais, entretanto, os atos de vandalismo são comuns, assim como a captura de pássaros na área.

           

            Albuquerque, Canoas e Vargem Grande (Teresópolis)

            Saindo da BR-116 em direção à RJ-130, tem-se acesso às áreas menos urbanizadas e de perfil mais rural do município de Teresópolis. Além da ocupação residencial, nota-se também uma infraestrutura voltada para as atividades turísticas com várias pousadas, hotéis-fazendas, haras e sítios. As belezas naturais, associadas ao relevo, representam importantes elementos motivadores do turismo rural e ecoturismo. Atividades agrícolas também se destacam, principalmente, a horticultura a partir da localidade de Vargem Grande. Em menor escala, áreas de pastagem coexistem na paisagem. Também observamos a presença de uma serraria e de uma fonte de água mineral explorada industrialmente (marca Teresópolis).

 

            Cachoeira dos Frades (Teresópolis)

            Em quase toda extensão desta localidade prevalece o uso pecuário, sendo que os pastos se estendem morro acima até os limites do parque. Os problemas de erosão do solo são bastante evidentes em função do uso extensivo da área. Área de grande apelo turístico e lazer em função da presença da Cachoeira dos Frades e dos acessos para atividades de caminhada e montanhismo. Existe captação de água mineral na área, porém, o licenciamento ainda não foi concedido à empresa. Esta área requer atenção especial em função dos incêndios ocorridos em anos anteriores e que costumam se alastrar pela área do parque.

 

            Torres de Bonsucesso (Teresópolis)

            Área predominantemente agrícola (horticultura) nos setores de menor declividade e que tendem a avançar pelas encostas. Existe uma grande demanda de água para atender a produção agrícola e o uso de agrotóxicos é muito comum. Existem atrações que favorecem a presença de turistas nas férias e feriados prolongados, principalmente em direção às Torres de Bonsucesso.

 

            Salinas, São Lourenço e Barracão de Mendes (Nova Friburgo)

As três localidades se situam numa mesma bacia de drenagem podendo ser acessadas através de uma estrada que tem início na RJ-130. Em Salinas, como mencionado anteriormente, fica localizado um dos núcleos de fiscalização do parque. A área conviveu, anteriormente, com problemas de caça e incêndio, que diminuíram com a instalação do núcleo e a fiscalização. Muitos turistas costumam frequentar a área nos feriados e período de férias para visitar a formação dos Três Picos, que dá nome ao parque. Nas proximidades dos Três Picos, numa localidade chamada de Vale dos Deuses, existem instalações particulares que exploram o turismo (2 pousadas e 1 camping). O dono do camping já teve problemas com a administração do parque por ter cercado uma área e cobrado pelo acesso dos turistas.  Depois de uma ação judicial, a cobrança foi interrompida. Os registros dos turistas que freqüentam a área são encaminhados para a sub-sede. No entorno, existem mais 4 pousadas que mantém uma relação harmônica com a administração do parque. Existem também moradores que cobram pelo estacionamento de veículos dos turistas. Existe um proprietário que cria gado leiteiro dentro do parque e, segundo informações prestadas pela fiscalização, procura proteger a área.

            As áreas no entorno do PETP apresentam manchas de vegetação florestal secundária, pastagens e pequenos núcleos de produção agrícola de feijão, milho mandioca, salsa, etc.           Nas localidades de São Lourenço e Barracão de Mendes, ocorrem muitas plantações de tomate e jiló com uso intenso de agrotóxicos. Na paisagem ainda observamos mosaicos compostos de matas secundárias, pastos e vegetação rupestre. O montanhismo é uma prática comum na localidade de Barracão de Mendes.

           

Teodoro (Nova Friburgo)

Área limítrofe ao parque apresentando um mosaico de usos urbanos com moradias permanentes de baixa renda, residências temporárias de renda média e alta, atividades comerciais (bares, restaurantes, pousadas, etc). Existe uma pousada localizada no interior do Parque (Vale dos Sonhos) e uma torre de telefonia celular nas proximidades. As atividades desenvolvidas na localidade representam riscos potenciais maiores em função da maior densidade populacional (esgoto, lixo, animais domésticos, etc), maior fluxo de automóveis e turismo.

           

            Macaé de Cima (Nova Fribugo)

            A área é caracterizada por atributos naturais de rara beleza tanto pela vegetação florestal bem preservada quanto pelos aspectos hidrográficos, com ênfase no rio Macaé de Cima. Os acessos acontecem através de estradas estreitas, esburacadas e foram observados muitos pontos de instabilidade de solo ao logo do percurso. Existem várias propriedades (sitos e casas) dentro da área do Parque, além de pousadas. Existe um grande potencial turístico, mas a precariedade dos acessos se constitui no maior obstáculo. Também foram observadas pequenas atividades de criação de gado e agricultura.

           

            Caledônia (Nova Friburgo)

            Na localidade de Caledônia o relevo é bastante acidentado e existem muitos afloramentos rochosos. A vegetação arbórea secundária forma mosaicos com a vegetação rupestre.  A área tem grande potencial para realização de caminhadas e apreciação da paisagem. Prevalecem os usos voltados para o lazer e o turismo com residências e sítios dispersos pelas encostas. Existem pousadas e, pelo menos, um Hotel Fazenda na área. Nas partes mais altas encontram-se diversas torres de transmissão de sinais de TV, rádio e telefonia.

            Gaviões e Correntezas (Silva Jardim)

            Em Silva Jardim, as áreas no entorno do parque são caracterizadas por uso, predominantemente, pecuário. Existem, também, algumas plantações (porte médio) ao longo das estradas que dão acesso à localidade de Gaviões e Correntezas. As estradas, nos dois casos, não são pavimentadas e criam certas dificuldades de acesso durante os períodos chuvosos. Por elas, pode-se chegar próximo dos limites do parque. As áreas de pecuária são de grande porte (fazendas) e estabelecidas sobre relevo mais ondulado (Gaviões) e plano (Correntezas). Os pastos, em certos locais, avançam sobre as áreas mais íngremes. A vegetação florestal encontra-se fragmentada, formando um mosaico com os pastos existentes. Os limites do PETP localizam-se nos pontos mais elevados ao fundo das áreas visitadas.

 

            Estudo das ocorrências

            A partir da análise das notificações emitidas pela administração do PETP, foi realizada uma análise das ocorrências entre novembro de 2003 e março de 2008. Não foram consideradas aquelas emitidas com a finalidade de prevenir possíveis impactos à área de preservação, ou seja, com fins educativos. As demais notificações e intimações, contendo as coordenadas obtidas com GPS, permitiram marcar os pontos e/ou locais onde ocorreram as situações conflitantes com os objetivos de preservação do parque, tais como: queimadas, desmatamento, apreensão de animais silvestres, entre outras.

            No período considerado, registraram-se 54 ocorrências, sendo que em 2006 houve o maior número de casos (12, ou seja, 22,2%). Entretanto, nos três primeiros meses de 2008, 9 situações de conflito já tinham sido detectadas. As ocorrências mais comuns em todo o período foram: apreensão de animais silvestres (27%), fogo (24%), desmatamento (15%) e corte + fogo (13%). Em menor escala, ocorreram outros tipos de problemas, tais como: abertura de estradas sem licença (4%), apreensão de palmito (2%), antenas de celular (2%), acidentes com veículo (2%), rede elétrica (2%), alterações hidrológicas (2%) e outros (7%).

            Em relação aos municípios, as localidades de Teresópolis lideraram as ocorrências com 57%, seguido por Cachoeiras de Macacu (28%) e Nova Friburgo (13%).

            As ocorrências de corte e/ou fogo na vegetação, quando somadas, totalizaram mais de 50%, além de produzirem impactos de forte repercussão ambiental. Numa análise mais detalhada, observamos que os anos de 2004 e 2005 concentraram 61,3 % dos eventos (19).  Em 2008, entre janeiro e março, não tinham ocorrido eventos desta natureza. Mais uma vez, as localidades de Teresópolis (Meudon, QuintaLebrão e Albuquerque) lideraram neste tipo de ocorrência (52%), seguido por Cachoeiras de Macacu (26%) e Nova Friburgo (19%). A análise sobre a extensão dos cortes e queimadas da vegetação demonstra que a maioria ocorreu em áreas inferiores à 2 ha (60%). Os eventos em áreas com mais de 5 ha representaram 33,3 % dos casos.

 

Conclusões

            Os resultados indicam que a área compreendida pelo PETP é de alta relevância para conservação ambiental em função de diversos aspectos. Entre eles, destacamos:

Ø  preservação da alta biodiversidade associada à Mata Atlântica através de um corredor que interliga, legalmente, grandes extensões de áreas já protegidas pelo Parque Estadual do Desengano e Parque Nacional da Serra dos Órgãos;

Ø  proteção de importantes mananciais hídricos estratégicos para o desenvolvimento urbano de diversas cidades no seu entorno, incluindo a grande região metropolitana fluminense;

Ø  proteção de paisagens de grande valor geológico, florístico e hidrográfico e suas respectivas associações com as práticas turísticas e ecoturísticas regionais.

 

Entretanto, considerando a sua grande extensão territorial, o parque ainda carece de uma infraestrutura adequada voltada às práticas de fiscalização e, principalmente, dentro de uma perspectiva educacional e preventiva. Os recursos originados de medidas compensatórias aplicados até o momento, não foram suficientes para atender às grandes demandas requeridas pelo parque. Mesmo estando subutilizada, a sede de Cachoeiras de Macacu, apresenta uma boa estrutura de funcionamento, comparativamente aos outros parques estaduais mais antigos. O mesmo não se pode falar dos núcleos (Jacarandá e Salinas), onde as condições precárias não são compensadas pelo esforço e boa vontade dos poucos funcionários terceirizados. Se não houver injeção de recursos oriundos de novas fontes e políticas públicas motivadoras do fortalecimento dos mecanismos de consolidação do parque, corre-se o risco de sucateamento das estruturas já existentes e agravamento dos problemas territoriais observados.

Grande extensão da área do parque é formada por áreas de relevo muito acidentado o que dificulta ocupações e exploração direta, como agricultura e pecuária. As atenções convergem para o entorno, onde observamos um mosaico de situações envolvendo turismo, crescimento urbano, agricultura e pecuária. Cada uma destas situações de uso pode produzir efeitos diretos e indiretos para os objetivos de conservação do parque, tanto positivos quanto negativos.

As práticas turísticas já vem se desenvolvendo a algum tempo na região, particularmente nas áreas das vertentes ao norte. Acredita-se que, em geral, tendem a valorizar o próprio território do parque estimulando as caminhadas e o montanhismo, ou simplesmente, o usufruto da natureza através das atividades de hospedagem em pousadas, hotéis e hotéis-fazenda. A região, representada no circuito Teresópolis-Nova Friburgo (RJ-130), apresenta exatamente este perfil e, nos últimos anos, vem se consolidando como grande núcleo de turismo no estado do Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, observamos que as atividades agrícolas são muito desenvolvidas, o que confere à área a condição de ser o maior pólo de horticultura do estado fluminense. Estas atividades são acompanhadas pelo intenso uso de agrotóxicos. Muitas dessas áreas fazem limite direto com o parque, mas não se sabe exatamente quais os efeitos concretos disso. Os sistemas de drenagem migram em direção oposta ao parque, mas há riscos de contaminação de espécies animais que, eventualmente, interagem com os ecossistemas agrícolas.

As atividades de caça e apreensão de animais silvestres já foram mais intensas, mas ainda ocorrem e os registros da direção do parque comprovam isso. As localidades de Meudon, QuintaLebrão e Albuquerque (Teresópolis) e também em Cachoeiras de Macacu, lideram este tipo de ocorrência, fato relacionado com a presença dos principais núcleos de ocupação urbana no entorno do parque. Muitos dos casos registrados não se configuram como atividade comercial, mas como prática tradicional de moradores, principalmente os de baixa renda, que mantém aves silvestres em cativeiro. Diferentemente, temos as apreensões de palmito, como no caso da localidade de Canoas em 2006 (Teresópolis), em que os infratores portavam 1 ton. do produto.

Entretanto, os casos mais graves e que merecem maior atenção da direção do parque, envolvem as práticas de desmatamento e fogo. No histórico de fiscalização, já foram interditados fornos de produção de carvão, realizadas apreensões de madeiras e registrados vários incêndios. A maioria dos cortes e queimadas ocorreu nas áreas ao norte do parque, principalmente nas vizinhanças de pastos e zonas agrícolas, particularmente em localidades de N. Friburgo (Barracão de Mendes) e Teresópolis (Bonsucesso, Frades e Albuquerque). Um número grande de incêndios, de menores proporções, também foi verificado nas localidades de QuintaLebrão e Meudon, mas os motivos parecem estar associados à ocupação urbana desordenada (invasões, capim colonião, lixo, balões, etc). Nas localidades ao sul do parque, os registros ocorreram em Guapimirim, Guapiaçú e Cachoeiras de Macacu.

A estrada de rodagem que atravessa o parque (RJ-116), representa um dos maiores riscos permanentes de produção de impactos negativos, particularmente pela circulação de cargas perigosas (combustíveis, produtos químicos, etc). A responsabilidade maior recai sobre a concessionária que administra a via (Rota-116 S/A) e que também integra o Conselho Consultivo do parque. A estrada se constitui numa importante artéria de comunicação entre a baixada e a região serrana e, também, de ocupação ao longo de suas margens. Neste caso, a administração do parque passa a ter uma grande responsabilidade diante dos eventuais conflitos gerados nestas circunstâncias. Muitas das ocupações, pequenas e médias, observadas ao longo da estrada são anteriores à criação do parque, logo requerem um estudo para regularização fundiária ou ajustes de procedimentos no sentido de garantir a conservação da área. A segunda hipótese nos parece mais objetiva e viável a curto e médio prazo.

Os limites legais estabelecidos para o parque, principalmente por estarem associados a determinadas cotas altimétricas, incluíram diversas propriedades dentro do seu território. Existem casos de condomínios de luxo (Guapimirim), sítios (Canoas – Teresópolis; Teodoro e Macaé de Cima – N. Friburgo, etc), além de ocupações recentes de famílias de baixa renda (Meudon e QuintaLebrão – Teresópolis). Isso implica na necessidade de reconfiguração dos limites ou medidas de regularização fundiária que o estado vai ter que decidir sobre o assunto.

Finalizando, podemos afirmar que o PETP, mesmo apresentando aspectos positivos em relação a sua infraestrutura, convive com problemas semelhantes aos demais parques brasileiros no tocante às questões fundiárias, pessoal de apoio, recursos, etc. Pode-se constituir num importante elemento de política ambiental voltada ao desenvolvimento local e regional, desde que sejam priorizadas ações regulatórias e indutoras para este fim.

 

Bibliografia

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* Trabalho desenvolvido com apoio da FAPERJ (Processo nº: E-26/171.237/2006 - APQ-1)

[1] Biólogo, Dr. em Geografia pela Universidade Federal Fuminense (UFF) - lrvallejo@bol.com.br

[2] Licenciado e Bacharel em Geografia pela UFF  - rdmcampos@yahoo.com.br

[3] Licenciado em Geografia pela UFF  - juniorgeouff@hotmail.com