Revista geo-paisagem (on line)

Ano  4, nº 8, 2005

Julho/Dezembro de 2005

ISSN Nº 1677-650 X

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Autonomia carioca numa perspectiva sociológica

 

Marcos Vinicius Moura[1]

 

RESUMO

            O presente artigo tem como objetivo analisar a mobilização civil em torno da questão da desfusão do atual Estado do Rio de Janeiro; voltando assim com os Estados da Guanabara e Estado do Rio de Janeiro. Em especial analisou-se o desenvolvimento do grupo “Autonomia Carioca”, um dos principais defensores da idéia.

Palavras-chave : autonomia, Rio de Janeiro, movimento social .

 ABSTRACT

            The papper analyses an social mobilization which figth against the way Rio of Janeiro State was created. In special, we study the development of one group named “Autonomia Carioca”, one which has the goal to change the state.

Word-keys : autonomy, Rio de Janeiro, social mouvement .

I          INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho tem como objetivo avaliar e discutir a possível desfusão do Estado do Rio de Janeiro, discussão esta trazida por determinadas lideranças[2] da sociedade civil que insatisfeitas com à atual situação da cidade do Rio de janeiro defendem como solução única para a resolução dos problemas enfrentados pela cidade a sua autonomia em relação ao atual Estado do Rio.

Observou-se nos principais veículos de comunicação[3]  o tratamento dado ao tema – desfusão -, dessa forma buscou-se realizar uma análise imparcial quanto a mobilização civil em torno do tema, característica (mobilização civil) que se reforça a cada momento na sociedade brasileira, seminários e palestra deixam claro o crescimento da mobilização civil relacionados ao tema.

O estudo se deteve em analisar o desenvolvimento do tema nos principais meios de comunicação, uma vez que observamos a maneira a qual tal questão estava sendo veiculada pela mídia.  Pode- se observar que interesses eleitoreiros e econômicos antecedem os interesses da grande massa da população.

 

II         ANÁLISE HISTÓRICA

 

Passados trinta anos da fusão da Guanabara com o antigo Estado do Rio, hoje o assunto ainda é tema de discussão. Podemos perceber atualmente a questão vindo a tona, só que agora com o tema desfusão do Estado do Rio.

              A idéia da fusão decorreu das primeiras discussões sobre a transferência da capital federal do Rio de Janeiro e a preocupação com o futuro da cidade. Isso proporcionou uma cultura favorável à fusão. Em 1967 e 1969 a “Ditadura Militar” realizou profundas mudanças na federação, como a fusão, sem a necessidade de um plebiscito (como era indicado para um caso como este, na constituição de 1946).

Segundo estudiosos no assunto, a cidade do Rio de Janeiro era um foco de oposição ao regime militar. Como o Estado da Guanabara era o único estado governado pelo MDB, partido de oposição, esperava-se com a fusão debelar este foco ao juntar o “conservadorismo” fluminense com a “vanguarda” carioca. A perspectiva era de que com a fusão seria possível alterar a representatividade da população numa Assembléia Legislativa Estadual unificada, através de uma nova correlação de forças entre os partidos MDB e ARENA (Aliança Renovadora Nacional).

Além da visão política mencionada acima, havia também a visão técnica (econômica) para se defender a fusão como uma forma de otimizar o desenvolvimento regional. A idéia era de que havia um pólo rico (a cidade do Rio de Janeiro), com grande arrecadação, e uma periferia pobre (a Baixada Fluminense) com muita carência de infra-estrutura. Assim como um estado não podia investir no outro, a fusão faria desaparecer o impedimento político-administrativo da transferência de recursos entre as duas áreas.

 

III       MOBILIZAÇÃO CIVIL

 

Entretanto, observamos na sociedade atual um pujante crescimento da mobilização civil acerca do tema fusão/desfusão do estado do Rio. Há hoje a mobilização civil através de grupos que lutam pela desfusão do Estado do Rio, ocorrida segundo estes de forma inconstitucional.

O movimento “Autonomia Carioca”, assim por eles denominados, é o grupo que vem ganhando maior destaque no cenário Estadual. O movimento se caracteriza como uma rede que visa divulgar a proposta do Estado da Guanabara, suprimido pela ditadura Geisel em 1975.

O movimento   divulga suas idéias através de outdoors e páginas na internet (www.autonomiacarioca.com.br), a qual trás consigo uma carta manifesto aos cariocas, um fórum de discussões , assim como a listagem dos que apóiam o movimento e os artigos na imprensa veiculados.

O movimento vem de forma eloqüente, invocando aos cariocas, assim como as pessoas que por tal movimento se sintam simpatizadas a entrarem na luta pela desfusão do Estado. Pode-se analisar o movimento, assim como as pessoas nele envolvidas, marcadas por um traço profundamente regionalista, mantendo uma crítica direta aos métodos do grupo do ex-governador Garotinho. Como podemos observar com o seguinte fragmento do então secretario Municipal, Alfredo Sirkis, um dos principais defensores da desfusão:

“...embora o motor da autonomia carioca seja uma profunda revolta que nós cariocas sentimos, ele deve procurar não se expressar de forma agressiva, pois seria prejudicial à viabilização do objetivo. A solução tem que ser boa tanto para cariocas quanto para fluminenses. A cidade do Rio nunca teve vocação de governar o interior, temos essa característica de cidade-estado”.

            Se partirmos do pressuposto que movimento social seja tudo aquilo que se manifesta do ceio da sociedade podemos correr o risco de dizer que de fato nos encontramos diante de um movimento social. No entanto se atentarmos para o fato de que se trata de um movimento elitista, onde a preocupação principal seja garantir as eleições/reeleições e os lucros dos empresários, podemos nos questionar se de fato estamos diante a um movimento popular, devemos observar até onde a população manifestou-se diante do tema e não apenas um grupo restrito que compartilham dos mesmos códigos e hábitos.

A cobertura jornalística dada ao movimento foi de vital importância para a propagação do movimento. As reportagens trazidas a público, muitas vezes, através de cartas de leitores que lutam pela desfusão.

No entanto, podemos observar que a cobertura jornalística mantém-se limitada a determinados grupos difusores da idéia, o que faz com que grande parte das reportagens publicadas sejam parciais.

O que é interessante notar é que o movimento vem ganhando força na sociedade civil. A mídia escrita reforça o interesse de uma parcela da população pelo tema, haja vista que se publica até mesmo cadernos inteiros tratando do tema.

Através dos jornais e das colunas nas quais são publicadas as matérias podemos perceber a que público estas se destinam. A questão da desfusão do Estado do Rio mantém-se ainda limitada a uma pequena elite da população, que não agüentando mais os problemas enfrentados pela cidade do Rio vêem como solução para os problemas a desfusão do Estado.

 

IV        INTERESSES E INTERESSADOS

 

Enquanto isso a questão da desfusão está longe de se tornar assunto do cotidiano da grande massa da população; o que podemos esperar é que mais uma vez a grande massa não passe de uma simples massa de manobra para se atender aos objetivos de um determinado grupo.

Objetivando saber se o assunto se mantém “vivo” entre os parlamentares do Estado do Rio; enviou-se a ALERJ (Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) uma série de perguntas que teriam como objetivo avaliar o posicionamento dos deputados a respeito do assunto. No entanto, até o fechamento deste artigo nada se obteve como resposta; o que para nós significa que o assunto é irrelevante entre as autoridades parlamentares do Estado do Rio.

Entretanto podemos observar uma nítida dissociação entre determinados estamentos da sociedade: mídia, política e sociedade civil. O que denota até onde foi/é interessante para cada uma dessas parcelas da sociedade a discussão acerca da desfusão do Estado do Rio

Diante toda insegurança sofrida pelo Estado do Rio e pelo caos econômico trazido aos empresários da noite, a sociedade civil passa a se mobilizar em torno da questão e passa a defender como principal solução para o problema a desfusão do Estado do Rio, uma vez que o governo Estadual não encontra medidas para solucionar o problema, segundo os defensores da desfusão do Estado.

Uma vez tal fato trazido à tona, torna-se novidade na mídia passando assim a serem publicadas constantemente matérias a respeito do assunto. O que para muitos era um assunto já “morto” para outros era questão de urgência (basta lembrar que o período de maior veiculação na mídia, era durante o período eleitoral).

.           A questão da desfusão do Estado passou a ser defendida por lideranças políticas do município, que no período eleitoral passaram a defender veemente a desfusão do Estado – é importante ressaltar que nenhum partido assume para si a bandeira da desfusão –  encontrando forte apoio nos opositores ao governo Rosinha e nos empresários da noite carioca que vêem seus negócios ameaçados pela insegurança.

 

V         DAS OPINIÕES

 

Em pesquisa[4]  [3] realizada pelo instituto “Datta Uff” da Universidade Federal Fluminense no período de novembro de 2004, objetivando saber o posicionamento da população da cidade de Niterói sobre a possível desfusão do Estado do Rio de Janeiro, perguntou-se à população se seria ou não favorável a desfusão do estado do Rio de Janeiro; obtivemos como respostas os seguintes dados:

            Dos entrevistados 42% são contrários a desfusão do Estado, 40% se mostram à favor e 18% mostram-se imparciais; é importante ressaltar que o período em que fora realizado a pesquisa tratava-se de um período pós eleitoral; vale lembrar que os principais candidatos que viam a desfusão como tema de campanha eram candidatos da cidade do Rio de janeiro, o tema havia sido pouco explorado entre os candidatos do município de  Niterói.

 

VI        DISSOCIAÇÃO ENTRE DETERMINADOS ESTAMENTOS DA SOCIEDADE

 

 Podemos observar uma associação entre determinados estamentos da sociedade, onde cada um deles tira proveito do tema. A sociedade como forma de mostrar sua insatisfação quanto ao governo Estadual; a mídia como um ótimo tema para vender jornais e na política como forma de angariar votos.

Com o término das eleições podemos observar uma dissociação entre os seguintes estamentos. A sociedade continua se manifestando quanto à insegurança vivida na cidade do Rio; os jornais não mais veiculam matérias ligadas ao tema ( pelo menos com a mesma freqüência) e com o término das eleições não havia o porquê de determinados líderes políticos estarem defendendo tal idéia já que seus objetivos já foram alcançados (ou não) nas urnas.

No entanto, o panorama descrito acima fora observado num período anterior ao aniversário de comemoração dos trinta anos de desfusão do Estado do Rio, no período de comemorações o tema novamente volta à tona, com uma “força” só vista no período eleitoral – 2004 – onde o tema fora trabalhado como proposta de campanha de determinados candidatos.

Toda a mídia voltou-se para a questão da desfusão: diversas matérias foram veiculadas pela imprensa, documentários em canais de televisão e cadernos inteiros em jornais de grande circulação. Observamos neste período a grande possibilidade do tema desfusão sair dos círculos acadêmicos e intelectuais e tornar-se algo próximo de se concretizar; dessa forma, foi proposto ao Senado ao votação do projeto de lei que propõe consulta popular sobre a separação dos estados do Rio e da Guanabara, fundidos 30 anos atrás pelo governo militar.

O plebiscito seria realizado simultaneamente com referendo sobre o desarmamento, previsto para o início de outubro. Entretanto a votação foi sem sucesso, a possibilidade de uma consulta popular fora rejeitado pelo congresso volta então a situação já mencionada acima: a dissociação entre determinados estamentos da sociedade civil, perdendo assim todo enfoque dado ao tema  da desfusão.


 Volta

 

Notas



[1] Graduando em Ciências Sociais ( UFF ). Contato : mviniciusmoura@hotmail.com

[2] Entendemos aqui por lideranças, pessoas com um determinado grau de influência na sociedade – formadores de opinião – tais como: jornalistas, políticos e movimentos civis

[3] Jornais, internet, revistas...

[4] A seguinte pesquisa  teve como margem de erro 5%, foram aplicados 400 questionários no período de novembro de 2004.